FBC é um dos mais interessantes e perspicazes rappers do Brasil atualmente. Após anos como integrante do coletivo DV Tribo, em 2018 chutou as portas com S.C.A (acrônimo de Sexo, Cocaína e Assassinato), um dos melhores discos daquele ano. A capa, na qual aparece despojado ao abraçar Cristo crucificado em um cemitério de BH, é um marco e faz referência à INRI, disco clássico da banda de trash metal Sarcófago. Em Padrim, disco lançado no fim de 2019, FBC repete a façanha. Trata-se de um dos melhores álbuns de 2019 e também uma das melhores capas do ano: um registro de festa de aniversário de criança com o qual todo mundo que cresceu em bairros de menor poder econômico é capaz de se identificar.

E identificação é uma das palavras-chave. Direta ou indiretamente, as letras de FBC letras abordam o cotidiano não só da periferia, mas de qualquer pessoa no Brasil atual. As formas através das quais preconceitos sociais e raciais nos impactam permeiam suas letras. De cara, “Money Manin” descreve um rolê pelo centro de Belo Horizonte, um assalto na volta pra casa e contextualiza seu protagonista de forma inteligente (“Esse tênis ganhei / a camisa roubei / Tudo isso do mesmo mano / A corrente eu comprei, eu mesmo parcelei no governo do Lula, mano”). Sem contar o trecho “Parece até que me fizeram voodoo / Magia branca lá do Donald Trump”, em que faz uma reviravolta com a expressão de cunho racista “magia negra“.

A crítica social tem seu auge na pesada “Assim que se sente”, na qual racismo estrutural, meritocracia e luta de classes são sintetizados em menos de 3 minutos.

Diz a qual a distância que tu tá do tiro
E eu te direi o peso do seu privilégio
Me diz se algum dia tu buscou seu filho
Com a boca em pleno vapor em frente ao colégio
Eu não sei
E, se alguém souber, fingiu
O quadro é grave, precisamos de mais Marielles vivas
Sendo vidas livres, porque as correntes…
Talvez pra nos lembrar o que fomos
Pra não sermos novamente
É assim que se sente
Quando a Polícia para a gente
Pergunta da roupa e da tatuagem
Pra onde tá indo e se tem passagem
É assim que se sente
O doc tá pago, não condenado
Eu tava aqui igual todo mundo
Me diz a razão dessa abordagem

Trecho de “Assim que se sente”

Mesmo com o forte posicionamento político e contestador, Padrim aborda mais questões de cunho pessoal e sentimental do que seu antecessor. São questões ligadas ao sucesso no rap e suas consequências (em “Capa 3” e “Confio”, esta, com participação da MC Ebony), amorosas (“Iphone” e “Se eu não te cantar”, a protocolar balada romântica, que aqui vem embalada em arranjo jazzístico) ou relacionais (“$enhor”, com participações de BK e L7nnon).

Um dos diferenciais de FBC é disponibilizar suas músicas em versões instrumentais nos serviços de streaming, assim como versões acapella das faixas (ou seja, as faixas de voz, sem acompanhamento instrumental). Seja desapego ou ferramenta de marketing, é uma ação que estimula a produção de obras derivativas e potencializa o alcance de suas músicas, principalmente entre DJs.

FBC _ Padrim
Lançamento: 15 de novembro de 2019
Produção: Go Dassisti

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